sexta-feira, 31 de agosto de 2012

O urubú

   Eu tinha apenas 9 anos de idade mas, jamais esquecerei aquela manhã de domingo.
Meu pai era um apaixonado por caçadas. Naquela época não haviam muitas restrições quanto a isso e, frequentemente ele ficava tôdo um final de semana no mato, atrás de algum animal que pudesse ser colocado na panela. Normalmente eu o via chegar com tatus e coelhos amarrados nas suas costas.
   Nêsse mal fadado final de semana, como minha mãe havia ido visitar uma irmã que morava um pouco longe, ficamos sòzinhos, meu pai e eu. Já no sabado ele começou a se aproveitar da ausência de mamãe e tomou alguns goles a mais. No domingo, logo cêdo, recomeçou, "para curar a ressaca", dizia. Quando sai da cama o encontrei sentado na calçada dos fundos de nossa casa que estava situada sôbre uma pequena elevação cujo declive, com mais ou menos duzentos metros de extenção, terminava às margens do rio araranguá, onde haviam alguns coqueiros.
 - Tonho! Vá buscar a "surda" - Disse êle.
 - Já vou pai - Respondi, pois naquêle tempo  a gente obedecia sem protestos, embora eu  tivesse muito  mêdo da "surda"
   "Surda" era o nome da velha espingardinha de um só disparo que usava uma balinha calibre .22
 - Filho, "tá" vendo aquêle urubú no galho daquele coqueiro lá embaixo?
 - Claro pai! respondi.
 - Então vai lá busca-lo, hoje teremos um bicho prêto no almôço! - Disse e disparou... e acertou!!
Como um menino obediente e, já que estava me divertindo, arrangei um saco de estôpa, pois não sentia vontade nenhuma de andar com u urubú debaixo do braço, e fui.
   Após vários minutos voltei cansado. O biche era pesado!
nêsse interim, êle já havia colocado um chaleira de água para ferver e preparado uma gamela para limpar a ave e uma grande panela de ferro para cozinha-la.Comecei a observar enquanto ele tentava tirar as penas que teimavam em não querer sair e, liberavam umas coisinhas prêtas, que pareciam bichinhos. Parei de olhar quendo resolveu arrancar o couro e mostrar aquela carne cheia de músculos e tendões.
   Enquanto ele se ocupava do copo de do animal eu fui brincar. Após algumas horas, nem lembro quantas, êle me chamou para almoçar. Só tinha um pouco de arroz do dia anterior, uma salada de alface e aquela carne estranha, quase sem tempêro. Almoço horroroso para uma criança. Mas a fome era grande e resolvi tentar uma coxa. Para mim, o único pedaço que se pareceu com carne de galinha.
Que carne dura! Nem eu nem papai conseguimos comer aquela carne. O velho resolveu jogar tudo fora  e eu fui procurar pão no armário. Meu pai continuou com seu copo e a ouvir suas músicas preferidas no velho rádio enquanto eu fui brincar com meus amiguinhos no outro lado da rua.
   O que não sabiamos era que o visinho havia visto tudo o que fizemos sem dizer uma palavra para nós, mas contando tudo para minha mãe, quando ela voltou no dia seguinte. Sei que no outro dia, mamãe jogou várias panelas, prátos e talheres para o fundo do rio e ambos tivemos que ouvir um baita sermão, embora eu tentasse dizer que não tinha culpa de nada.   

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